Emanuele Ferreira Lessa- MSc. Química, atualmente  doutoranda em Química Tecnológica e Ambiental na área de Físico-química. Pesquisadora com ênfase no desenvolvimento de dispositivos par adsorção de  efluentes em corpos d’água. Técnica em Química no IFSUL  Pelotas, Graduação em Pedagogia  e Licenciatura em Química- UFPEL

Novembro é o mês em que fala-se sobre consciência negra no Brasil, o último país a abolir a escravidão. Mas por que ainda nos dias atuais é tão necessário lembrar sobre as questões da desigualdade social que enfrentamos no Brasil? E por que é relevante refletir sobre as questões de gênero e raça, sobretudo nas universidades brasileiras? Eu, enquanto mulher, negra e discente de um programa de pós-graduação de uma universidade pública na área das exatas, tendo ingressado na mesma a partir das cotas raciais, sinto-me na obrigação de compartilhar com os leitores um pouco da jornada acadêmica que é, muitas vezes, solitária, muito pela questão da pouca representatividade negra nos espaços acadêmicos. Enquanto defensora do feminismo e do feminismo negro na universidade, percebo o quanto nossa sociedade precisa melhorar nesse aspecto criando ações que venham a contemplar a participação das mulheres. Mesmo sabendo que historicamente, as mulheres enfrentaram inúmeros desafios na tentativa de inserir-se nas ciências, por ser um ambiente estruturalmente concebido e moldado para atender às necessidades dos homens, escolhi a área das exatas. Mas fazendo um recorte mais recente, percebe-se que esse paradigma não foi alterado com o passar dos anos e por isso as reflexões sobre o ingresso e permanência principalmente de mulheres negras na universidade é fundamental.

Recentemente, no que se refere a inclusão da população negra na universidade a Lei das cotas raciais – Lei 12.711/2012 tem sido efetiva, em seus 10 anos de ação é possível constatar resultados positivos como, em 2018 quando os negros se tornaram a maioria nas universidades federais com 50,3% (IBGE, Desigualdades Sociais por cor ou raça, 2019), tendo sido aprovada esse ano sua atualização a fim de contemplar a grande maioria dos estudantes. Porém, na questão do gênero nesses ambientes ainda é notável que a representatividade feminina está longe de refletir a composição racial do país. Cabe ainda um parênteses no que trata-se das mulheres negras universitárias, elas sofrem dupla opressão que amplia sua vulnerabilidade. Dessa forma, abordar pautas feministas, sem falar sobre as discriminações sofridas por mulheres racializadas, é calar as vozes dessas pessoas. Nas universidades do Brasil, em 2021, as mulheres representam a maioria como membros do ensino superior nos cursos de graduação ou pós-graduação, sendo as mulheres negras maioria enquanto estudantes. Porém, a compreensão dos processos que levam à exclusão da mulher negra nas Ciências requer um olhar mais amplo sobre as múltiplas opressões que se somam de modo intrincado e produzem formas combinadas de exclusão e desigualdade social. Vale ressaltar que apesar da pequena representatividade negra enquanto cientistas no Brasil, as mulheres trazem pesquisas de muito valorosas, principalmente nas áreas historicamente dominadas por homens. 

O interesse das mulheres negras pela ciência pode surgir de repente, e é comum sentir-se perdida para começar a explorar todas as possibilidades, isso ocorre devido à falta de referências. No Brasil, a representatividade feminina é mais expressiva nas ciências da saúde e da vida. Contudo, nas ciências exatas – física, química, engenharia, matemática e astronomia – apenas 25% das mulheres estão presentes, de acordo com a UNESCO. Para as mulheres negras, os desafios são maiores devido aos preconceitos de gênero e raça, causadores do distanciamento de oportunidades nessas áreas que muitas vezes impedem futuros talentos nas ciências exatas. Apesar da escassa representatividade feminina negra, é fundamental que todas as meninas negras resistam e continuem com seus interesses na ciência. Acredito que é preciso incentivar as mulheres negras que estão nesses espaços educacionais para que elas ingressem e permaneçam. Não é tarefa fácil, mas enquanto acadêmica enfatizo que, mesmo diante da baixa representatividade, devemos seguir para nos projetar futuramente e garantir destaque em todas as áreas em especial às exatas. É preciso buscar melhorias a partir da educação antirracista, pesquisas da atualidade tem trazido contribuições em relação a permanência da população negra nas universidades, descrevendo o sentimento de não pertencimento ao adentrarem nas salas de aula – espaços de poder legitimamente ocupados em sua maioria por pessoas não negras. Considero imprescindíveis reflexões e debates sobre desafios enfrentados por mulheres negras na academia para construir um novo pacto civilizatório, baseado na justiça, equidade racial e democracia.